Etapa 16 – Refrescantes imprevistos

Colocado em 21 de Junho, 2018 | 0 comentários

Mais um dia a juntar à grande aventura deste ano, já praticamente na reta final.

A etapa de hoje ligou Laza a Cea. Para não variar muito, o programa de hoje incluiu subidas para todos os gostos e pernas. Logo para começar o dia, a grande subida a Albergueria foi remédio santo para por de parte o frio da manhã. Esta subida é bastante íngreme mas o piso em boas condições como que nos inibe de desmontar da bicicleta. Além disso com peregrinos a pé no Caminho a motivação para não dar parte fraca também é um facto :).

Lá em cima a paragem no Rincon del Peregrino é obrigatória. O local é um marco carismático do Caminho Sanabrês e ali é costume pegar numa das vieiras que estão à disposição, escrever o nome e a data e perpetua-se a visita, já que as vieiras forram as paredes e o tecto do local.

Antes de partir apercebi-me de que o pneu traseiro estava muito em baixo. Tendo uma câmara de ar com líquido, por cima montada nova em Granada, isto não era bom sinal. Meti um pouco de ar e segui viagem.

O próximo destino é Vilar de Barrio. Lembro-me bem desta localidade, no Caminho de 2012: albergue de grande qualidade e um pequeno restaurante onde comemos como lordes. Mas desta vez não era ponto de paragem, mas sim de pausa técnica. Como tinha o pneu relativamente em baixo (a bomba de ar que trago não tem dado muito conta do recado), aproveitei o facto de ter uma bomba de combustível por perto para dar mais pressão ao pneu. Assim que encho o pneu, apercebo-me do furo. Para não descartar a câmara de ar com líquido, reparei a câmara. A verdade é que algo não ficou a 100%, porque boa parte da viagem passou por parar em postos de combustível para encher o pneu.

O objetivo daí para a frente era chegar a Ourense antes das 13:30, para encontrar uma loja de bicicletas aberta e comprar uma câmara de ar com líquido. A verdade é que o Caminho depois de Xunqueira de Umbria é essencialmente feito por estrada, o que me pareceu estranho. Eu fui seguindo o track gps, bem como as setas amarelas. Não sei se existe alguma outra alternativa, mas recordo-me de ter ficado com a mesma impressão nas outras vezes que aqui passei.

Eram 12:30 quando lá cheguei. Rapidamente encontrei uma loja simpática onde tratei de comprar duas câmaras, para estar sossegado.

Segui viagem. Já não me lembrava mas quando preparei o track gps tinha colocado a hipótese de seguir uma alternativa até Cea que segue mais a sul. Eu já estava convencido de que ia seguir pelo caminho Real, mas quando saí de Ourense estranhei a paisagem.

Sabendo que Cea está a uma altitude considerável comparado com Ourense, fosse por onde fosse teria de subir e bem. E esta variante tinha pano para mangas! Quando saí das estradas principais, dou por mim numa estrada local (que mais tarde percebi que é uma antiga estrada romana que entretanto alcatroaram e abriram ao trânsito) do mais inclinado que possam imaginar. Às 14h o sol aquecia como um dia de Verão em pleno Agosto, agravado pelo calor que emanava do alcatrão. De repente foi um dejá vu de 2017, a fazer a subida de sombra em sombra.

Uns 3 quilómetros depois alcancei o topo da subida e a sensação de alívio de um sofrimento que terminou fez-se sentir.

Nessa altura eu pensava para mim que esta variante era definitivamente para descartar, até que no meio de nada vejo uma casinha pitoresca, cheia de motivos alusivos aos peregrinos, onde descansava um senhor de barba. Paro e pergunto se tem bebida fresca, a que recebi um simpático sim e um convite para entrar.

Trata-se de César, uma personagem deste Caminho que pelos vistos muitos conhecem e que foi um prazer conhecer. Estivemos bastante tempo à conversa e ele lá me foi explicando um pouco a sua história de vida, bem como as histórias e recordações que tem de muitos dos peregrinos que já por lá passaram.

São estes momentos inesperados que nos refrescam a alma (e neste caso também o corpo, que os dois aquarius frescos souberam pela vida)!

O restante caminho até Cea é bem bonito e merecedor da opção por lá. Algumas partes não são as melhores para bicicletas, com piso que tudo leva a crer que era uma antiga calçada romana, pelo que ou apreciam ir aos pinotes em cima da bicicleta Caminho acima, ou então é apreciar o passeio pedestre como eu fiz.

A chegada a Cea faz-se pelo mesmo caminho de terra que o outro percurso. O albergue da povoação surge pouco tempo depois.

Este albergue é também uma das referências do Caminho Sanabrês, mas lamentavelmente nota-se algum descuido na manutenção do mesmo. O funcionário que toma conta do albergue é o mesmo de sempre e uma personagem um tanto ou quanto única. Se pensarmos na forma como a figura do Zé Povinho está para o português, este senhor é a caricatura equivalente em Espanha. A unha grande, o bigode e o facto de estar o tempo todo deitado no sofá da entrada a dormitar acaba por ser caraterístico 🙂 Pelo menos este ano parece estar um pouco mais simpático com os peregrinos, o que é positivo.

Mal posso esperar que chegue amanhã, não porque é o dia de chegar a Santiago, mas porque tenho à minha espera um pequeno almoço com direito ao pão de Cea e mais algumas delícias!

É hora de descansar e de provavelmente dar uso aos tampões de ouvidos, que hoje há direito a ronco em Dolby ATMOS 🙂

Bom Caminho!

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